Três e dezoito da madrugada. Quem dera se Morfeu pessoalmente viesse para arrebatar-me aos braços do Sonhar, no entanto, foi a angustia embebida em pura euforia que bateu a minha porta. Por esse inusitado motivo, não deixaria de apresentar hoje meus companheiros, tão fieis a prolongadas noites... Meus suplicantes olhos vermelhos, antagônicos eternos de minhas exaustas pálpebras; as velhas olheiras, que de tão perfeito palco, permitem-se sediar tal briga; e por fim, a desenfreada paranoia... Plateia alerta e exigente por um belo combate. Assim vem sendo cada noite após minha última experiência na viela do French Quarter. Parece ser loucura, devaneio de uma alma crédula, que presa aos grilões de seu desejo, está entregue as travessas sombras de um inconsciente que se diverte com suas fantasias criadas, mas sei o que senti e sei que a muito vem acompanhando meus passos.
Hoje ao retornar aos meus aposentos, por volta de meia noite e trinta, pude notar sutis diferenças em sua harmonia estática. Percorri brevemente o cenário com um lance de olhar, antes mesmo de render um passo adiante. Cama impecavelmente organizada, diário, caneta e notebook exatamente como deixara sobre o criado mudo, gavetas e armários inviolados. Por um momento me parecera paranoia habitual, mas meus traços obsessivos oferecem-me um olhar investigativo invejável, ao ponto de notar que outro abrira minha janela está noite.
Saquei minha Glock semiautomática adormecida sobre a cintura e com passos de felino, pronto para se ocultar sob a mata, fui até a janela que transparecia as luzes da cidade. De fato, não falhei em minha avaliação, as trancas haviam sido sutilmente forçadas, apesar de não haver indícios do material usado. Encostado a parede, com minhas mãos trémulas e vergonhosamente suadas, observei através da janela antes de retomar minha atenção para o quarto. Levantei o lençol branco tão bem posto sobre minha cama, para me defrontar apenas com meus gastos sapatos e com o alívio de nada encontrar. Contornei-a, e com passos curtos e suaves fui em direção à suíte. O coração parecia romper o peito quando o ranger acompanhou-se da abertura da porta. Nada havia, além de um box fumê que encontrava-se aberto , um armário, uma pia e um sanitário que mesclavam-se entre o branco e o tabaco. Retornando ao quarto, de imediato abri gavetas e armários em busca de qualquer sinal de violação que aliviasse meu temor e perplexidade...
Estava na última gaveta... A prova do infrator... Uma caixa de sapato preta que não reconheci. Prostrei-a sobre a cama. Pensei em não abrir, com medo do que poderia me vir de tão inofensivo objeto. Hesitei, no entanto, a vontade sobrepujou o medo e lentamente abri a caixa. Forrada por ceda vermelha, um peculiar objeto foi visto em repouso. O dourado reluzia como resposta a luz do ambiente, as falsas pérolas abrilhantavam os sofisticados detalhes, e em sua volta, plumas vermelhas contornavam a parte superior. Eis o símbolo do Mardi Gras. Uma máscara inexpressiva, olhar profundo, vazio e de doce e singelo ar sombrio que contamina a alma com as mais diversas perversidades. Vaguei o olhar sobre a luminária do quarto buscando por respostas racionais que me levassem a justificativas. Sentei sobre a cama com a máscara em mãos, olhando para sua fronte perdido em pensamentos, e mal pude notar que a caixa havia caído ao chão. Ao levantar os olhos e fitar a caixa sobre o chão frio, percebi que a máscara não era o único objeto me presenteado...
12 de Setembro de 2010
Diário de Sebastian Bouvié
Pág. 14
Boa tarde meus caros.
ResponderExcluirEm primeiro lugar, perdoem-me o atraso. Minha conexão estava terrível ontem.
Em mais um capitulo, Sebastian Bouvié é surpreendido por fenômenos estranhos em sua casa. Onde será que isso vai dar?
Grande abraço e espero que gostem
Como sempre excepcional, como sempre um grande conto. Parabéns, beijitos
ResponderExcluirSua intensidade é contagiante! Já estou ansiosa pelos próximos capítulos! huahauahua.Mas prometo que dessa vez não vou importuná-lo tantoo. O fato é que eu adoro cada um dos seus posts...E como um risco de fósforo, vou me consumindo com suas palavras!
ResponderExcluirParabéns, coisa linda!